SE É DO MPLA ESTÁ INOCENTE

O grupo parlamentar da UNITA, o principal partido da oposição que o MPLA (ainda) permite em Angola, vai propor à Assembleia Nacional (formatada e dominada pelo MPLA) a votação de um Projecto de Resolução para se realizar uma auditoria independente sobre a gestão financeira do Tribunal de Contas. Numa nota de imprensa, o grupo parlamentar da UNITA refere que a votação do projecto deverá ocorrer na plenária do dia 21 deste mês.

O Projecto de Resolução da UNITA surge na sequência de notícias (também publicadas aqui no Folha 8), no início de Junho passado, relativas a despesas imputadas à juíza presidente do Tribunal de Contas, Exalgina Gamboa, dando conta de que esta supostamente teria gastado quatro milhões de dólares (3,7 milhões de euros) em mobílias a expensas do Estado angolano.

Para o grupo parlamentar da UNITA, trata-se de um assunto “de interesse público e urgente”, cuja auditoria independente proposta “não prejudica nem conflitua com outras medidas investigativas, cautelares ou disciplinares da esfera de competência dos órgãos jurisdicionais do Estado”.

A nota do grupo parlamentar da UNITA sublinha que o Tribunal de Contas é, nos termos da Constituição da República de Angola, o órgão supremo de fiscalização da legalidade das finanças públicas. Pois. É exactamente isso, se bem que país e MPLA, MPLA e Estado são uma e a mesma coisa há 46 anos.

“O Tribunal de Contas vela pela legalidade e boa gestão das finanças públicas, por isso, quaisquer situações que indiciem má gestão e desvalorização dos seus quadros colocam em causa a sua imagem assim como afectam seriamente a confiança dos cidadãos nas instituições públicas, sobretudo daquelas que deviam ser ícones da boa governação, transparência, independência e credibilidade”, refere-se no documento.

O grupo parlamentar do maior partido da tal oposição permitida pelo MPLA recorda que, em Fevereiro de 2019, a juíza presidente do Tribunal de Contas defendeu, em Luanda, “melhor qualidade nas auditorias e controlo às contas públicas, tendo em vista a dinâmica de governação do executivo, que pauta por uma maior transparência na gestão da coisa pública e combate à impunidade”.

“Nos termos do artigo 10º da Lei Orgânica do Processo do Tribunal de Contas, “as contas do Tribunal de Contas, incluindo a do seu cofre, são objecto de auditoria independente designada pela Assembleia Nacional com base em concurso público”, realça-se na nota.

Nesse sentido, o grupo parlamentar da UNITA entende que a Assembleia Nacional, órgão que supostamente exerce o poder legislativo do Estado a quem compete, entre outras, velar pela boa execução das leis e exercer a fiscalização e controlo político, “não pode ficar indiferente à crise de gestão do Tribunal de Contas”.

“O grupo parlamentar da UNITA entende que uma auditoria independente às contas do Tribunal de Contas, incluindo a do seu cofre é uma medida necessária e recomendável com o propósito de determinar a eficácia, eficiência e integridade dos processos e mecanismos de controlo interno do Tribunal de Contas, assim como a sua coerência com os princípios e valores aplicáveis às Instituições Superiores de Controlo (ISC) e o seu alinhamento à política de combate à corrupção”, indica-se no documento.

À Procuradoria-Geral da República (mais uma das sucursais do MPLA), o grupo parlamentar da UNITA insta “para que, a par das iniciativas da Assembleia Nacional, desempenhe de modo isento, independente e com rigor técnico o seu papel de defensor da legalidade”.

Recorde-se que no dia 28 de Junho, o vice-procurador-geral da República, Mota Liz, disse que denúncias de alegados desvios de fundos públicos por parte da presidente do Tribunal de Contas angolano, Exalgina Gamboa, “é matéria específica da PGR”.

“Esta é matéria específica da PGR e sobre isso não falo”, respondeu Mota Liz à Lusa, sem entrar em detalhes, quando questionado em relação a uma investigação sobre a presidente do Tribunal de Contas, Exalgina Gamboa.

As despesas da presidente do Tribunal de Contas de Angola, Exalgina Gamboa, que terá gastado quatro milhões de dólares em mobílias a expensas do Estado angolano, continuam sem explicações por parte da instituição ou da PGR.

O caso foi denunciado pelo jornalista e activista angolano Rafael Marques e Morais, no portal Maka Angola, sob o título “Tribunal de Contas é o mealheiro de Exalgina Gamboa” e dá conta das despesas da juíza, suportadas pelo erário público e que ascendem a vários milhões de dólares.

Revela que o Governo adquiriu, em 2020, uma casa no valor de 3,5 milhões de dólares (3,3 milhões de euros) para Exalgina Gamboa num condomínio de luxo, enquanto a juíza, posteriormente, gastou meio milhão de dólares (472 mil euros) na reabilitação da mesma.

O Cofre Privativo do Tribunal de Contas pagou depois cerca de 4 milhões de dólares (3,7 milhões de euros) pelo apetrechamento da residência, com mobílias adquiridas em duas empresas.

Mota Liz, que falava à margem da abertura da Conferência Nacional sobre a Reforma da Justiça, Sistema Penitenciário e Direitos Humanos, defendeu as acções da PGR no processo de combate à corrupção, considerando que este é um desafio de toda a sociedade.

“Enquanto instituição, a PGR procura fazer o seu trabalho, o combate à corrupção não é o trabalho de uma única instituição, é um desafio de toda a sociedade, inclusive da comunicação social, como defender que não devemos privilegiar unicamente a dimensão repressiva”, disse.

Para o magistrado, o país precisa de “estruturar a dimensão preventiva e pedagógica, que começa com o sistema de educação, com adopção de mecanismos de transparência na gestão da coisa pública, na educação cívico moral para a honestidade dos cidadãos e prevenir que os crimes ocorram”.

Em Angola, a corrupção “tornou-se numa espécie de uma questão cultural, uma prática comummente aceite como se fosse um valor, enquanto tivermos esta consciência não há cadeias que resolvam”, frisou o vice-PGR.

“Tens que inculcar na mente das pessoas que a corrupção é podridão, é pecado, se quisermos usando uma linguagem religiosa, e a sociedade tem que muda-la, ao mesmo tempo que tens uma máquina judicial afinada para responsabilizar quem ainda assim enveredar pela corrupção”, salientou.

Mas, observou, “uma máquina que tem de ter valores fortes, eficazes, com especialistas capazes de resistir à tentação de serem corrompidos e penso que nesta dimensão a PGR tem estado a fazer o seu trabalho”, referiu.

Tudo normal, portanto. No reino é mesmo assim. Mais uma vez se prova que o MPLA é Angola e que Angola é do MPLA e que, em 46 anos de governo, o MPLA passou a ser o maior partido do mundo com mais corruptos por metro quadrado.

O Tribunal de Contas limita-se a informar que as despesas realizadas pelo Tribunal constam dos relatórios anuais aprovados pelo plenário e que as despesas de capital são realizadas com base nos direitos e regalias dos magistrados, previstas na Lei n.º 7/94, de 29 de Abril, Estatuto dos Magistrados Judiciais e do Ministério Público.

Segundo a lei, os magistrados têm direito a várias regalias, incluindo entrada e livre-trânsito em vários locais de acesso condicionado, uso e porte de arma, protecção especial da sua pessoa e bens, casa do Estado ou a expensas do Estado devidamente mobilada, viatura do Estado para uso pessoal e pagamento de telefone, água e luz.

Têm também direito a 100% da renda, caso não ocupem uma casa do Estado, passaporte diplomático, bem como pessoal doméstico incluindo motoristas, cozinheiros e lavadeiras. O diploma é, naturalmente, omisso quanto a limites de despesas.

Segundo a lei orgânica do Tribunal de Contas (Lei n.º5/96), esta entidade dispõe de um cofre privativo, dotado de autonomia administrativa e financeira, gerido por um conselho administrativo com um mínimo de três elementos, a designar pelo plenário do Tribunal e em cuja composição participam o director de serviços técnicos e o director dos serviços administrativos.

Segundo a legislação constituem encargos do Cofre, além do pagamento das comparticipações emolumentares, outras despesas que não possam ser suportadas pelo Orçamento do Estado incluindo despesas resultantes do pagamento de subsídios, abonos ou quaisquer outras remunerações dos juízes ou do pessoal dos serviços de apoio, decorrentes da formação dos juízes e do pessoal dos serviços de apoio, resultantes da aquisição de publicações ou da edição de livros ou revistas, derivadas da realização de estudos, auditorias, peritagens e outros trabalhos ordenados pelo Tribunal.

A aquisição de mobiliário não consta entre os encargos do cofre privativo mas, é claro, está – como outras matérias – subjacente ao que subjaz da subjacência intrínseca à Constituição do MPLA e que, em linguagem autóctone, se diz “roubo, ladroagem. ladroeira, ladroíce” etc. etc..

Questionada a Procuradoria-Geral da República sobre se recebera denúncias relativas aos gastos sumptuosos de Exalgina Gamboa, ou se estão a investigar eventuais despesas ilícitas… a PGR “alegou” o sagrado direito ao silêncio bem como à presunção da inocência até que… Angola seja aquilo que (ainda) não é: um Estado de Direito Democrático.

Exalgina Gamboa tinha sido já alvo de notícias, veiculadas inicialmente pelo Africa Monitor e mais tarde pelo Correio Angolense, envolvendo o congelamento de contas de um filho seu, em Portugal, supostamente constituídas com valores proveniente da conta do Tribunal de Contas domiciliada no banco Yetu.

Na altura, a PGR de Angola reagiu, negando ter sido notificada pelas autoridades portuguesas sobre alegadas transferências bancárias das contas do Tribunal de Contas angolano para uma conta privada domiciliada num banco em Portugal. E, é claro, o Tribunal de Contas não se pronunciou sobre este caso, ao abrigo da presunção de que até que alguém prove o contrário… a República Agostinho Neto (Angola) é (mesmo) do MPLA.

Apesar disso, os angolanos são muito curiosos e continuam a querer saber de quem é a culpa de terem voado 2.5 milhões de euros e 500 mil dólares da conta bancária do Tribunal de Contas Angola para a conta bancária do filho da presidenta do Tribunal de Contas de Angola, em Portugal.

Em Portugal descobriram o cambalacho dos 2.5 milhões de euros e 500 mil dólares, que voaram da conta bancária do Tribunal de Contas, em Angola, para a conta bancária, em Portugal, do filho da juíza presidenta do Tribunal de Contas de Angola. No entanto, o PGR diz que Portugal ainda não o informou. Se o dinheiro voa de Angola para o estrangeiro e o PGR está em Angola e nada sabe, afinal de contas o que está a fazer o PGR em Angola? Ainda anda apenas a pastar caranguejos e marimbondos?

Folha 8 com Lusa

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